Numa longínqua noite de sábado, quando eu tinha 12 anos e ainda acompanhava minha mãe à missa, estávamos voltando para casa a pé, quando percebi que havia um sujeito nos seguindo.
- Mãe!
- O quê?
- Tem um cara seguindo a gente.
- Onde?
Quando ela se virou, ele havia sumido.
Continuamos andando e algum tempo depois, ele reapareceu.
- Mãe! Olha!
Tarde demais, o cara possuía a habilidade do Mestre dos Magos pra desaparecer.
- Pára de graça!
- Mãe, é sério!
- Você anda bebendo?
- Claro que não! Isso só vai acontecer daqui a 20 anos, quando eu tiver um blog.
- Um o quê?
- Esquece, mãe, ainda não inventaram. Eu acho...
Com 12 anos é óbvio que eu não bebia. E também não era médium. De modo que aquele cara não era um fantasma. Era real.
Ele era alto e forte e seu rosto era idêntico aquele personagem Wally, do livro “Onde está Wally?”
Nesse livro havia vários desenhos de pessoas e o desafio era você encontrar o Wally no meio deles.
Este é o Wally:
Encontre o Wally:
Seguimos em frente. Eu temia por mim e por minha mãe. O que aquele ser bizarro queria com a gente?
De repente, o perseguidor fez um gesto que me deu certeza absoluta que o negócio dele não era com a minha mãe: olhando fixamente pra mim, o cara deu uma segurada na sua parte íntima e uma forte mexida, como se mudasse a marcha de um carro com a embreagem ruim.
Encontramos um policial e eu, apavorado, contei que havia um cara nos seguindo. E então o “Wally” sumiu de vez.
Dias depois, estava eu voltando de um aniversário na casa do meu amigo Danianderson, quando, na mesma Praça da Igreja, ouço um “psiu”. Quando olho, lá estava ele com a mão nos “países baixos”.
Eu cheguei em casa tão rápido que até hoje tenho dúvidas se corri muito ou me teletransportei.
Fiquei com vergonha de contar pra minha família e acabei falando pra alguns amigos, entre eles, o Oscar.
E é claro que quando contei da “troca de marchas” o Oscar quase morreu de tanto rir. Mas, logo percebeu que o negócio era sério. Então, começamos a espalhar pra galera e a andar em bandos, para minha proteção.
Mas, não adiantou nada. O cara, todas as vezes que me via, fazia aqueles gestos obscenos olhando pra mim.
E foi por causa da sua “troca de marchas” que o apelidamos de “O Engatador”.
Pra piorar a situação, o cara trabalhava numa loja cujos fundos davam para a quadra de esportes do clube que eu e meus amigos jogávamos basquete. Da janela, o cara ficava fazendo “psius”, me chamando, perguntando meu nome, dizendo que queria “só” conversar comigo etc. Eu ficava mudo de medo e os meus amigos, todos da mesma idade, também.
Por que não jogávamos basquete na outra cesta? Porque desgraça pouca é bobagem. A outra cesta estava quebrada na época.
Você conhece alguém que aparentemente é calmo, mas, na verdade, dentro dele possui um vulcão que de vez em quando entra em erupção?
Prazer! Eu sou desse tipo.
Pois bem, certo dia, Oscar e eu estávamos jogando basquete quando O Engatador apareceu na janela. Ele começou com suas gracinhas e eu fiquei com a cara muito fechada, muito sério.
O Oscar conta essa história pros outros até hoje e, segundo o relato dele, nesse dia, eu estava acertando todas as cestas, numa espécie de concentração que beirava o transe e que talvez só Michael Jordan conseguisse alcançar nos momentos decisivos das partidas.
E o Engatador falando...
Meu desempenho na quadra de basquete estava cada vez mais impressionante. Tivesse um olheiro da NBA ali, eu tava feito. Houve um momento em que o Oscar achou que eu, com 12 anos e 1, 56m de altura, poderia enterrar.
E o Engatador falando...
De repente, peguei a bola de basquete e joguei com toda a minha força em direção a janela em que o Engatador estava. A bola explodiu na grade de proteção e eu explodi em palavrões e insultos de todos os tipos em direção aquele pedófilo que me xavecava.
- Eu vou te pegar, moleque!
- Vem aqui se você for homem, seu filho da p*#@!!! Eu vou macetar você com as minhas mãos!!!
Nunca vi o Oscar com os olhos tão arregalados, parecia a Marge Simpson.
Como eu não parava de xingar e gritar, o Engatador sumiu dali.
E eu nunca mais o vi... Até que...
Dias atrás estava conversando com um amigo na rua, quando o Engatador passou e o cumprimentou.
- Você o conhece? – perguntei.
- Conheço, trabalhou comigo.
Fiquei sabendo do seguinte: o Engatador havia se convertido a uma rigorosa religião e havia se casado. Inclusive, a mulher de saia e buço assustador que o acompanhava era sua esposa.
Fosse eu vingativo e ele iria ver: colocaria uma berinjela de Itu dentro da calça e quando ele estivesse saindo de terninho da sua igreja eu diria o seguinte:
“- Ei! Psiu! Vem aqui! Eu só quero conversar com você!”
E daria uma sacudida na berinjela.